De acordo com um estudo realizado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), nos últimos 20 anos o Brasil investiu somente 2,18% do Produto Interno Bruto (PIB) em infraestrutura, um valor muito baixo se comparado com as demais economias emergentes, que investem entre 4 e 5% do PIB para melhorar a infraestrutura.
Outro dado que confirma a falta de investimento do Brasil neste setor do país é o ranking do Banco Mundial sobre contratação de obras de 2015: entre os 189 países analisados, o Brasil ocupa a posição 169ª, atrás de países vizinhos como Chile e Peru que ocupam a posição 24ª e 48ª, respectivamente. Já na análise de 2018 do Logistics Performance Index and its Indicators (LPI) o Brasil ocupa a 56ª posição de 167 países, apresentando a nota 3,1 de 5 no quesito “competência logística”.
Essas informações são só a ponta do iceberg que denuncia os grandes problemas de logística enfrentados pelos brasileiros e que atrapalham o desenvolvimento do mercado interno e externo. Ao mesmo tempo, setores predominantemente dependentes da estrutura logística encontram-se em expansão, como é o caso do e-commerce e do agronegócio, gerando um grande desequilíbrio entre a demanda e capacidade de entrega do setor logístico do país.
Alguns estudiosos do tema apontam que esse desequilíbrio não será superado tão já, afirmando que os problemas de logística vão permanecer na realidade brasileira pelo menos nos próximos 15 anos, principalmente em relação ao transporte terrestre, com destaque para o rodoviário, responsável por transportar 80% dos produtos no país.
E são diversos os fatores que tornam o transporte rodoviário tão ruim: a qualidade das rodovias é muito baixa, assim como a sua manutenção e conservação; os gastos com pedágios são altos e numerosos; os combustíveis utilizados – baseados em petróleo – além de muito caros, prejudicam o meio ambiente ao lançarem muitos poluentes ao ar e sofrem muita instabilidades nos valores – somente em 2017 foram 115 ajustes no valor da gasolina do Brasil.
Nesse cenário caótico, cabe ao empreendedor/a compreender melhor sobre a logística do país, para que possa encontrar soluções criativas e menos custosas para esse grande gargalo que traz muitos prejuízos e problemas operacionais às mais diversas empresas. Para isso, vale responder algumas perguntas básicas.
Como a área de transportes funciona no Brasil?
O Brasil é um país extenso e muito plural em sua geografia, por conta disso, sempre foi pontuada como uma dificuldade para o país o desenvolvimento de uma rede de transportes sólida e interligada. De fato, até hoje o Brasil enfrenta muitos problemas de deslocamento, principalmente por conta do acumulo do tráfego nas redes rodoviárias e falta de investimento estatal no setor.
De qualquer modo, a rede de transportes brasileira é dividida em 5 modais cuja responsabilidade é a realização do transporte e logística de produtos e/ou pessoas, sendo que cada modal apresenta características particulares:
1. Modal Ferroviário
De acordo com o Anuário Estatístico de Transportes de 2017, o Brasil possui 30,6 mil km de estradas de ferro, distribuídos em 32 estradas diversas sob a responsabilidade de 13 concessionárias. A rede ferroviária é responsável por 21% do transporte de mercadoria realizado no país, sendo que este modal é majoritariamente utilizado para transporte de commodities.
Apesar desta opção de transporte ser positiva em relação ao custo-benefício, o Brasil apresenta uma rede ferroviário muito incipiente, pois enfrenta diversas dificuldades na padronização das linhas devido à diversidade da geografia – e relevos – do país. Ao mesmo tempo, a garantia de segurança e manutenção é bastante difícil no modal ferroviário.
2. Modal Rodoviário
Mesmo com todos os problemas da malha rodoviária brasileira, este modal é o mais utilizado pelo país, sendo responsável por mais de 60% da carga transportada. A principal vantagem do modal rodoviário é a sua extensão por todo o território brasileiro, já que é o único que consegue chegar a praticamente todos os pontos de envio e recebimento do país.
Por outro lado, a lista de desvantagens é enorme: alto custo para os motoristas, seja por conta da manutenção, combustíveis ou pedágios, o fato é que o custo do transporte rodoviário é alto. Em termos de logística, a média do frete praticado pelo modal ferroviário em 2016 foi de R$ 140, segundo dados da Aprosoja.
Ao mesmo tempo, o Estado paga caro para manter as rodovias conservadas e enfrenta muitas dificuldades em aplicar um padrão de qualidade de conservação geral. Da mesma forma, a manutenção da segurança nas estradas é igualmente desafiante, seja por conta do alto índice de roubo de cargas ou por causa da alta taxa de acidentes no trânsito.
3. Modal Aeroviário
O transporte aéreo é responsável por apenas 0,4% do transporte de cargas brasileiro, sendo reservado para a logística de produtos preciosos ou extremamente perecíveis. Apesar deste modal apresentar como características centrais a agilidade e alto nível de segurança, a pouca utilização do transporte aéreo advém do custo elevado desta modalidade, assim como maior limitação dos espaços e a existência de poucos aeroportos no país.
4. Modal Hidroviário
14% do transporte de cargas do Brasil é realizado via aquaviária, que carregam grande parte das commodities – como grãos e minérios – do país. Apesar de o número parecer expressivo, este modal é subutilizado pelo Brasil, tendo em vista que somente 14 mil km são explorados no país. Países como Rússia e China exploram 102 mil e 110 mil km de seu modal hidroviário, respectivamente, muito acima do que é realizado no Brasil.
Dentre as principais vantagens deste tipo de modal encontra-se o baixo custo de manutenção e utilização, muito abaixo do rodoviário e ferroviário. Por conta disso, seria interessante se o governo realizasse mais investimentos neste setor, principalmente na modernização e ampliação do alcance dos portos.
5. Modal Dutoviário
É um modal bastante incomum no Brasil e que possui 19 km por todo o país, sendo responsável pelo transporte de grãos sólidos, substâncias liquidas e gasosas – como combustíveis.
Quais os principais desafios de logística enfrentados?
A infraestrutura é com certeza um ponto de atenção quando o assunto é logística. E neste aspecto duas considerações são válidas:
i) a extensão do país e sua grande diversidade tornam quase impossível para somente um responsável garantir a expansão e manutenção de toda a rede de transportes, ao mesmo tempo, a aplicação de inovação neste setor enfrenta as mesmas dificuldades, aliadas à grande desigualdade social e econômica do país nas diversas regiões;
ii) já que é difícil para somente um ator se responsabilizar pela tarefa, o governo tem adotado como política pública as terceirizações e concessão de licitações a empresas privadas – externas e internas – para a expansão e manutenção das redes de transportes, porém essa solução esbarra em duas questões. Por um lado é difícil manter um nível eficaz de padronização em todos os projetos, já que eles são executados por mais de uma empresa responsável, ou seja, aplicar um gestão eficiente e homogênea é um desafio enorme; por outro lado, o país enfrenta um grande histórico de corrupção, de modo que o setor de transportes e construtoras têm um papel de destaque na questão, portanto, garantir uma gestão de qualidade ainda enfrenta o fantasma da corrupção tão fincada na realidade do Brasil e que tanto atrapalha o desenvolvimento do país.
De qualquer modo, pode-se pontuar como os principais desafios da logística brasileira a falta de infraestrutura de qualidade, a defasagem da estrutura de transporte, a ausência de conexão entre os diferentes modais, a grande concentração do transporte no setor rodoviário e falta de segurança nas vias.
Outro desafio marcante é o tempo, pois é impossível pensar e aplicar soluções eficazes para resolver todas essas questões dentro de um período curto, porém o mercado tem evoluído de maneira cada vez mais rápida e exige que as soluções lhe acompanhem. Esse desalinho pode aumentar ainda mais a desigualdade entre demanda e entrega no futuro.
Da mesma forma, a falta de especialização do mercado neste setor é ao mesmo tempo uma oportunidade e um desafio. Enquanto oportunidade, aponta-se que há grande espaço e possibilidade de desenvolvimento do setor de logística – para se ter uma noção, a única empresa que consegue atender o comércio país em termos amplamente nacionais é o Correios, que é uma empresa pública. Enquanto desafio, voltamos à questão de um só responsável por um projeto monstruoso; voltando ao exemplo do Correios, o ideal seria a maior participação de empresas privadas ou mesmo empresas públicas, mas que pudessem “dividir” o problema entre si. Ao quebrar as operações, a eficiência poderia ser aumentada, o monstro não seria tão assustador, já que a setorização de tarefas e regiões tornaria o processo mais localizado.
O fato é que a solução para esse grande problema é mais complexa e complicada, e não cabe dentro de uma análise geral como este, mas a utilização de técnicas de gestão aliadas ao emprego da tecnologia podem tornar o cenário mais agradável e menos abrasivo. Para isso, o primeiro passo é investir na produção de conhecimento e estudos acerca da logística, de maneira que a teoria e a prática possam se interligar de modo eficiente e produtivo.